O Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgar a ADPF nº 347/DF, reconheceu a existência de um Estado de Coisas Inconstitucional (ECI) no sistema carcerário brasileiro. Essa decisão histórica aponta a violação massiva e estrutural de direitos fundamentais da população carcerária e impõe medidas concretas ao Poder Público.
O que é o Estado de Coisas Inconstitucional?
Inspirado na jurisprudência da Corte Constitucional Colombiana, o ECI ocorre quando há uma violação generalizada e contínua de direitos fundamentais, resultante da omissão persistente dos poderes públicos. A superação desse quadro exige mudanças estruturais e a atuação conjunta de diversas autoridades.
O julgamento da ADPF nº 347/DF
Em 4/10/2023, o STF, por maioria, julgou parcialmente procedente a ADPF para reconhecer o ECI e ordenar medidas urgentes. A relatoria foi do Ministro Marco Aurélio, com redação do acórdão pelo Ministro Luís Roberto Barroso.
As principais medidas determinadas foram:
- Realização de audiências de custódia presenciais em até 24 horas da prisão;
- Fundamentação obrigatória da não aplicação de alternativas à prisão;
- Liberação de recursos do FUNPEN;
- Elaboração e implementação de planos nacional, estaduais e distrital, com cronogramas e indicadores;
- Monitoramento pelo CNJ/DMF e homologação obrigatória dos planos pelo STF.
Teses fixadas pelo STF
- Reconhecimento do ECI no sistema carcerário por violação massiva de direitos fundamentais;
2. Elaboração de planos integrados por União, Estados e CNJ para controle da superlotação e melhoria das condições prisionais;
3. Estudo pelo CNJ para criação de varas de execução penal proporcionalmente às varas criminais e à população carcerária.
Responsabilidade do Estado e proteção ao mínimo existencial
O STF reafirmou que a dignidade do preso integra o mínimo existencial e que o Estado tem o dever de garantir padrões mínimos de humanidade nos presídios. A negligência quanto a isso gera responsabilidade civil objetiva, nos termos do art. 37, §6º da CF/88.
Tentativas de afastar a indenização com base na reserva do possível foram rechaçadas. A Corte entendeu que tais argumentos não podem justificar a perpetuação das condições degradantes dos presídios.
Remição x Indenização
Embora o Ministro Luís Roberto Barroso tenha sugerido a remição da pena em substituição à indenização, o STF fixou o entendimento de que o Estado deve pagar indenização pecuniária pelos danos morais decorrentes de condições indignas de prisão.
Outros precedentes relevantes
- ADPF nº 976 MC-Ref/DF – STF reconhece potencial ECI na situação da população em situação de rua (Info 1105);
• ADPF nº 347 TPI-Ref/DF – STF veta ampliação do objeto da ação para incluir medidas relacionadas à Covid-19 (Info 970);
• ADPFs 743/DF, 746/DF e 857/MS – STF decide que não há ECI na política ambiental da Amazônia e Pantanal (Info 1129);
• AgRg no RHC 136961-RJ – STJ determina contagem em dobro do tempo de pena em presídio degradante (Info 701).
Conclusão
O reconhecimento do Estado de Coisas Inconstitucional no sistema prisional representa um marco no ativismo judicial estruturante do STF. Mais do que uma decisão declaratória, o julgamento da ADPF nº 347 impõe providências concretas ao Estado, reafirma o valor da dignidade da pessoa humana e fortalece o papel do Judiciário na defesa dos direitos fundamentais de populações vulneráveis.
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