A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, no julgamento do REsp 2.161.548/BA (Tema 1303), que a confissão do investigado durante o inquérito policial não é requisito para a oferta de Acordo de Não Persecução Penal (ANPP). Por unanimidade, o colegiado fixou que a formalização da confissão pode ocorrer apenas no momento da assinatura do acordo, diante da natureza negocial do instituto.
Teses fixadas:
- A confissão pelo investigado na fase de inquérito policial não constitui exigência do art. 28-A do Código de Processo Penal para o cabimento do ANPP, sendo inválida a negativa de formulação da respectiva proposta baseada em sua ausência.
- A formalização da confissão para fins do ANPP pode se dar no momento da assinatura do acordo, perante o próprio órgão ministerial, após a ciência, avaliação e aceitação da proposta pelo beneficiado, devidamente assistido por defesa técnica.
Fundamentos da decisão
O cerne da controvérsia era definir se a recusa do Ministério Público em ofertar o ANPP, com fundamento na ausência de confissão na fase inquisitorial, seria válida. O STJ respondeu negativamente, afirmando que tal exigência é indevida e contraria o caráter negocial do instituto.
A Corte reafirmou que o ANPP é um negócio jurídico processual, o que exige que as condições de sua celebração sejam debatidas e estabelecidas dentro de um processo de negociação formal, com a participação da defesa técnica. Não se pode exigir, portanto, que o investigado abra mão de garantias constitucionais antes mesmo de saber se haverá ou não proposta de acordo.
Ademais, condicionar a oferta do ANPP à prévia confissão em sede inquisitorial:
– Viola o direito ao silêncio e a garantia de não autoincriminação (art. 8.2, “g”, da Convenção Americana de Direitos Humanos);
– Cria uma exigência não prevista na legislação (art. 28-A do CPP);
– Fere a lógica da justiça negocial, pois impõe obrigação unilateral ao investigado antes mesmo da abertura das tratativas.
O STJ apontou que exigir a confissão fora do ambiente controlado e garantidor do contraditório e da ampla defesa implica desequilíbrio processual e risco à voluntariedade do ato.
Compatibilidade com a CADH
O Tribunal também reforçou a necessidade de interpretação do art. 28-A do CPP à luz da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José), destacando que:
– Não se pode obrigar o indivíduo a confessar antes de saber se haverá acordo (art. 8.2, “g”);
– Tampouco se pode impedir o acesso ao ANPP em razão do exercício desse direito (art. 29, “b”).
Precedentes e coerência jurisprudencial
A decisão harmoniza-se com os entendimentos anteriores das Turmas da Terceira Seção, como o fixado no Tema 1098 e nos HCs 838.005/MS e 879.014/PR, nos quais o STJ reconheceu a necessidade de confissão no ANPP apenas como parte do processo negocial, a ser realizada em momento oportuno, e com a devida assistência jurídica.
Impactos da decisão
– Reforça a natureza negocial e voluntária do ANPP;
– Protege os direitos fundamentais do investigado;
– Uniformiza a interpretação do art. 28-A do CPP;
– Garante maior segurança jurídica na aplicação do ANPP.
Aprofunde-se no tema
Confira uma análise detalhada sobre essa decisão do STJ e os reflexos para o processo penal negocial no vídeo abaixo:
Referência:
REsp 2.161.548-BA, Rel. Ministro Otávio de Almeida Toledo (Desembargador convocado do TJSP), Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 12/3/2025. (Tema 1303).
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